Pão artesanal é menos seguro do que o vendido no supermercado
Georgia Castro
24/09/2018 04h00
Crédito: iStock
Se alguém lhe perguntar se você prefere um pão artesanal (feito em casa ou comprado em uma loja de produtos naturais) ou outro comprado no supermercado, ambos feitos com farinha integral, amêndoas e uva-passa, tenho quase certeza que escolheria a primeira opção. Diria que o pão feito de forma artesanal é mais gostoso e saudável. Não posso discutir gosto, mas posso afirmar que a versão caseira não é necessariamente a que trará menos problemas à saúde.
Não me refiro apenas ao perfil nutricional do alimento, ou seja, às quantidades de gordura total, saturada, trans, sódio e açúcar — o último, em geral, aparece como carboidrato na tabela nutricional –, mas quero dizer que você deve considerar a sua segurança. O pão artesanal não costuma ter aditivos químicos, nem uma quantidade tão alta de sódio quanto o pão industrializado. Mas é preciso também levar em conta o risco de contaminações microbiológicas, biológicas, químicas e físicas.
Riscos de contaminação estão por toda parte
Se temos fungos e leveduras no pão ou mesmo uma bactéria, como Bacillus cereus, que talvez provoque um belo desconforto gastrointestinal. Bactérias, claro, não são visíveis a olho nu, mas bolores e leveduras –os benditos fungos — podem ser notados e são bem comuns nos pães, quando o ambiente é úmido. O que fazer? Descartar o produto, pois esse é um sinal evidente de que podem existir outras contaminações ali. E, decididamente, ele não está adequado para o consumo.
Algumas bactérias produzem toxinas, assim como os fungos, liberando as ditas micotoxinas, capazes de levar a diarreias severas até mesmo a problemas neurológicos. Outro perigo é a eventual presença de metais pesados, como chumbo, cádmio e arsênico. Eles podem estar na farinha, por causa da contaminação cruzada do solo ou de equipamentos do moinho.
Acabou? Que nada! Existem os contaminantes físicos, como aqueles ácaros geralmente encontrados nos travesseiros e colchões. Sim, eles também podem estar presentes nos pães e nos derivados de farinhas, assim como fragmentos de insetos e até mesmo cinzas, que costumam vir de sujidades desde o campo até a área de fabricação e distribuição do pão.
Como a industria se previne dessas contaminações?
Na indústria, porém, são feitos todos os controles imagináveis —tudo deve ser medido, monitorado, controlado. E isso não é nada fácil, tampouco barato. Muitas vezes é necessário realizar análises laboratoriais para controlar e corrigir o processo, trocando matérias-primas e fornecedores, substituindo equipamentos, revendo a embalagem e até mesmo avaliando a sequência da linha de produção e manuseio de operadores.
Então, dizer que o pão artesanal é melhor pode ser relativo, porque ele não passa por tantos controles, garantindo um padrão de segurança de alimentos. A lei no Brasil –aliás, não apenas aqui, mas na Europa, nos Estados Unidos e em vários outros países — obriga que as indústrias façam de tudo para evitar qualquer tipo de contaminação. Caso algum teste mostre um resultado fora dos limites aceitáveis, os produtos devem ser recolhidos de todos os pontos de venda.
Esses processo também é seguido por muitas das grandes padarias. Agora, o estabelecimento comercial menor ou o produtor artesanal que compra farinha e outros grãos da zona cerealista, adquire as frutas do Ceasa e, daí, elabora o pão integral, muitas vezes não tem estes controles e ainda o rótulo pode não estar adequado às leis vigentes. Você acha então que esse pão é realmente mais seguro?
Deixo essa pergunta para você pensar quem realmente tem condições de fazer controles. Mais ainda, quem é fiscalizado e, algumas vezes, denunciado se algo não está correto. Acredito que seja a indústria.
Não estou tirando a responsabilidade de essa mesma indústria produzir alimentos com melhor perfil nutricional. Mas, lembre-se sempre para dizer que um alimento é mais saudável do que outro, você precisa considerar se ele também é mais seguro.
Sobre a autora
Engenheira de alimentos pela Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais, e doutora em nutrição pela Universidade Estadual de Campinas e pelo INRA, na França, Georgia Castro passou mais de 20 anos na área de assuntos científicos e pesquisa aplicada de algumas das maiores indústrias de alimentos do mundo, conhecendo como poucos os bastidores da produção daquilo que chega à nossa mesa. Atualmente, trabalha como coach de saúde e bem-estar.
Sobre o blog
Um espaço para você saber a verdade e compreender a composição dos alimentos embalados, aqueles que compramos no supermercado, nos atacados, nas lojas de conveniências ou que pedimos em cantinas, lanchonetes, bares e outros locais tão presentes na vida cotidiana. Assim, com informação, você será capaz de fazer escolhas de forma mais consciente.